“Mainha dizia que quando eu me casasse Raimunda era minha”

vulvamtilliandum
2 min readNov 19, 2022

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O racismo da patroa contra a empregada é um crime altamente vantajoso para o sistema patriarcal, capitalista e racista porque ele ao mesmo tempo que fortalece as estruturas masculinas-e-brancas de poder ele enfraquece politicamente o grupo “mulher branca”, cujo único poder real deriva do feminismo. E quando um perfil de mulher é politicamente enfraquecido, todos os demais também são e ficamos todas ainda mais reféns dos homens e da heterossexualidade para sobreviver.

A raiva, o ódio e o ressentimento que os episódios públicos de racismo dessas patroas desperta contra todo o grupo “mulher branca”, as torna ainda mais dependentes da proteção masculina branca. E, uma vez dependentes de proteção, eles a oferecerão justamente às mulheres brancas mais leais e mais obedientes a eles e às suas instituições.

O que a patroa branca racista, leal aos homens brancos, tem, de fato, a perder? Qual o poder das vítimas de castigá-la ou boicotá-la? Não é raro que o modo de vida que a patroa exibe, seja como dona de casa dondoca, empresária, funcionária pública ou pessoa pública seja sustentado por estruturas controladas por homens brancos de sua própria classe social ou superior. Sem o desejo deles, a racista não é sancionada.

Resta à vítima e ao grupo racial a que pertence recorrerem ao estado. O fato de pessoas negras terem apenas o estado para recorrer para conseguir atingir seus agressores é revelador da nossa falta de poder enquanto grupo. Ao buscarmos desesperadamente essa alternativa, somos obrigadas a reconhecer e a fortalecer esse leviatã, aquele que, efetivamente, é o maior garantidor de todas as opressões vigentes, tendo sido criado justamente para isso. Esse mesmo estado, na maior parte das vezes, não apenas não oferece proteção à vítima como também a revitimiza. A proteção que o estado oferece aos oprimidos é seletiva. Nunca é uma proteção assegurada.

No fim, sentindo que não podemos contar umas com as outras, todas as mulheres, como grupo, somos impelidas a aumentar as lealdades aos homens de nosso próprio grupo racial o que, normalmente toma a forma de heterossexualidade ou se realiza através dela, e, consequentemente, enquanto mulheres, saímos todas enfraquecidas.

O racismo da patroa contra a empregada é um crime perfeito. Não ser devidamente reprimido pelas instituições legais, não ser devidamente rechaçado pela mídia, apenas exibido por alguns canais de maneira que só acirra o ressentimento, não é um acaso, é um propósito.

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